segunda-feira, junho 25, 2007

Poucas Palavras, Muita beleza.



Alguns minutos antes do início do espetáculo, neste domingo no Teatro do CIC, Sassá Moretti, a idealizadora do Festival Internacional de Teatro de Animação - FITA, subiu ao palco para se despedir do público que acompanhou o evento: - Não precisamos falar mais nada, os bonecos já disseram tudo nesses cinco dias de Festival! Com certeza teremos o segundo FITA no ano que vem! - O público aplaudiu entusiasmado. Empolgação? Pode ser. Mas a verdade é que pouca gente acreditava que um festival de Teatro de Animação poderia atrair tanto público em Florianópolis. E o que é melhor, atraiu um público que saiu extremamente satisfeito com a qualidade dos espetáculos.

Neste domingo eu também saí bastante satisfeita da apresentação de Houdini's Suitcase. Espetáculo da Cia. Piclekd Image do Reino Unido, com direção de Emma Loyd e atuação de Dik Downey e Vicky Andrews. Uma estação de trem, muitas malas e a memória de um velho homem são os elementos que nos vão sendo apresentados, lentamente, muito cuidadosamente. Dentro dessas malas encontramos vários personagens que nos surpreendem por sua força em cena. Não é apenas uma imagem que nos sobra após o espetáculo. São fragmentos da memória de um homem, narrados com muita criatividade, humor e ritmo. Apoiado sobre uma sonoplastia poderosa e descritiva, o espetáculo ainda conta com uma iluminação precisa. Simples, mas rica na criação de climas distintos. Os bonecos são muito bem acabados, talvez os mais vistosos que tenhamos visto neste festival e a animação deles também não deixa nada a desejar em técnica e vida. Outro ponto alto é a corporalidade construída por Dik para sustentar a máscara que utiliza durante todo o espetáculo.



Não pude assistir à tantos espetáculos quanto eu gostaria neste festival. Assim, meus comentários serão tentando analisar o todo pelas parte que pude prestigiar. O que pude perceber foi um grande nível na qualidade dos espetáculos. Uma curadoria mais acertada do que foi visto no Isnard Azevedo. Aqui os espetáculos parecem estar com um grau maior de acabamento e técnica, não deixando margens para tantos questionamentos estruturais das obras.

Um único senão para ser pensado pela organização do festival é a utilização dos dois grandes palcos nesta edição. Se o palco do Teatro Ademir Rosa parece demasiado grande para vários espetáculos que se apresentam alí, esse tamanho parece ter se tornado insuportável para os trabalhos do FITA. Manologias simplesmente ignorou que estava num palco daquele tamanho e Houdini's Suitcase poderia ter sido muito melhor absorvido num palco como o TAC, por exemplo. O Centro de Artes e Eventos da UFSC não é, nem de longe, um local apto para apresentações teatrais. Se a Universidade tem o desejo de realizar apresentações teatrais naquele local poderia tentar realizar algumas adaptações na estrutura física para isso.

Vida longa ao Fita, que a segunda edição seja ainda melhor!

domingo, junho 24, 2007

Diversidades no Fita!




A programação do Festival Internacional de Teatro de Animação de Florianópolis continua recheada de surpresas e bons espetáculos. Infelizmente não pude acompanhar os espetáculos da sexta-feira, assim que resolvi fazer um pequeno intensivo no sábado para recuperar o tempo perdido. Encontrei-me com três espetáculos bastante diversos entre eles, mostrando a riqueza e as apropriações possíveis que cabem sob o rótulo de Teatro de Animação.


Meu dia começou com o divertido espetáculo dirigido pelo grupo Cirquinho do Revirado, de Criciúma, SC. Este mesmo grupo esteve participando do Festival Isnard Azevedo com um espetáculo de rua. Em O Sonho de Natanael nos encontramos com uma estrutura de contação de histórias que se utiliza dos bonecos para ilustrar e apresentar os personagens para os espectadores. Uma boa relação com a platéia é a grande virtude do espetáculo, que se apóia numa estética mais folclórica. Uma vertente que aparece com bastante frequência nos espetáculos de rua e para crianças e, talvez por isso, causando uma certa sensação de deja-vú.


Na parte da tarde assisti ao espetáculo Manologias do Grupo La Santa Rodilla, radicado no Perú mas com um elenco formado por um italiano, um argentino e uma peruana. Dirigido por Hugo Soares (do grupo Teatro de Hugo e Inês, bastante famoso entre os bonequeiros) é o primeiro espetáculo deste novo grupo. Formado por quadros que não se preocupam em formar uma unidade, tem como elemento agrupador a técnica de utilização de diversas partes do corpo para compor os personagens. Assim, temos elementos extremamente simples e que exigem bastante virtuose dos atores/animadores, onde se sobressai o trabalho cômico de Renato Curci. Mesmo com um diretor bastante conceituado, o espetáculo sofre de uma certa inconstância: algumas cenas são bastante bem resolvidas, metafísicas em alguns momentos, em outras ainda impõe um maior desafio aos atores para ajustes de timing e limpeza na manipulação.


Se, em Manologias, o trabalho estava mais centrado na criação das imagens com o corpo dos manipuladores, em Em Camino, espetáculo solo de Sérgio Mercúrio, de Banfield na Argentina, o caminho de busca parece estar na construção das diferentes atmosferas e personagens bastante marcantes. Já havia ouvido falar do trabalho deste bonequeiro, mas ainda não havia tido a chance de vê-lo em cena. A simbiose com o personagem principal (Bob) é perfeita. Seu personagem respira, pensa e reage quase que sozinho. Temos a impresão até mesmo de que o boneco muda de expressões faciais, fruto da virtuose de seu manipulador. Uma variada gama de sensações nós envolve durante a apresentação, indo do lirismo aos palavrões em 05 segundos. As memórias de sua viagem pelas Américas é um fio tênue que abriga sob um mesmo guarda-chuva histórias tão distintas entre si.


De qualquer maneira são três trabalhos que servem para discussão entre os limites na classificação Teatro de Animação. Se é que esses limites existem.

sexta-feira, junho 22, 2007

Da Técnica Apurada ao Salto Poético!!!!


Segue a programação do Fita - Festival Internacional de Teatro de Animação e dentro dela pude acompanhar mais dois espetáculos. Uma das características mais marcantes que venho percebendo no trabalho dos bonequeiros que vieram à Florianópolis é a qualidade técnica na criação dos espetáculos. Falando dessa maneira, deveria ser algo óbvio. Para a criação de um espetáculo é necessário conhecer a técnica do trabalho que se está disposto à fazer... mas nem sempre é assim. Comparando com os espetáculos do Isnard Azevedo, por exemplo, o nível dos trabalhos apresentados no Fita parece superar facilmente as expectativas.

Seria essa diferença apenas um reflexo de uma curadoria mais acertada na escolha dos espetáculos? Ou, seria um reflexo da própria linguagem do teatro de bonecos? Explico: Assim como o músico toca um instrumento para expressar sua arte, também o bonequeiro necessita aprender a usar seu instrumento (boneco, máscara, forma, títere, sombra, etc) para estabelecer uma comunicação eficaz através dele. Cria-se, apartir disso, uma consciência da necessidade de aprender uma técnica, renová-la, pesquisá-la para expressar-se através dela. No caso do teatro feito por atores, é mais comum essa falta de consciência. É mais comum encontrar a crença de que basta ser "carismático" ou "um lindo modelo" para poder atuar. Generalizações à parte, existem milhares de exemplos que confirmam esta regra, em ambas as técnicas. Vai daí que é muito comum encontrarmos bonecos que não atuam, somente "chacoalham" em cena, assim como encontrar grupos de teatro que realmente desenvolvem pesquisas centradas na força da atuação dos seus integrantes.

De qualquer forma, o grande desafio parece poder reunir técnica e construção de poética durante uma mesma realização. No caso dos espetáculos de Teatro de Animação é bastante comum termos muita técnica à serviço de pouca expressão. Não chega a ser o caso do espetáculo O Senhor dos Sonhos da Cia. Truks, de São Paulo, SP. O espetáculo, dirigido por Henrique Sitchin, conta a história de Lucas, um menino que tem dificuldades em situar-se entre o sonho e a realidade. É uma bela realização que diverte e encanta, principalmente as crianças. Ao mesmo tempo, não propõe nenhuma mudança significativa ao panorama das realizações de espetáculos para crianças ou mesmo de animação. O elenco conta com uma técnica afiada de manipulação que se utiliza de variadas técnicas para contar uma história.


Por outro lado, podemos apreciar também à O Princípio do Espanto, espetáculo do grupo Morpheus Teatro, também de São Paulo. Espetáculo solo de João Araújo com direção de Luiz Andrade, não se utiliza das palavras para contar sua história, com excessão de um poema de Rilke, utilização em off no início e no fim do espetáculo. Utilizando precisamente da técnica de manipulação-direta, o espetáculo ousa ao explorar um ritmo muito particular e um certo estranhamento presente em toda a duração da obra. Suas pausas, suas pequenas ações e pequenos truques (como a saída da vassoura da caixa, por exemplo) vão guiando os espectadores por um caminho desconhecido e intrigante. O espetáculo não oferece respostas fáceis, deixando um espaço bastante grande para ser completado pelo espectador.

Dessa maneira, chegamos a um salto poético, fartamente perseguido, mas raramente logrado no teatro contemporâneo. Não é puramente elocubração intelectual e conceitual, pois o espetáculo toca o público e emociona. Mas também não é teatro que se rende facilmente à agradar seu público para que ele saia feliz e saltitante do teatro. Uma obra de arte, como todo espetáculo deveria ser!

quinta-feira, junho 21, 2007

O Sonho e O Avarento!



Resultado do sonho e do esforço dos artistas, o FITA - Festival Internacional de Teatro de Animação abriu nesta quarta-feira para trazer 15 grupos de vários países, estados brasileiros e cidades de SC.

O espaço (Centro de Cultura e Eventos da UFSC) pode não ser o mais adequado, mas a emoção falou forte na primeira noite de espetáculos do Fita. No discurso da coordenadora geral e idealizadora Sassá Morretti e da coordenadora executiva Zélia Sabino, ficou claro que este acontecimento teatral era um sonho há muito acalentado pelos bonequeiros de nosso estado. Quebrar o vácuo que existia na capital, que não participava do circuito de festivais internacionais de animação realizados já há muitos anos em Canela e Curitiba, sem contar com outros estados do país. Após anos e anos de luta e sonho, finalmente foi concretizado o festival que abriu oficialmente nesta noite de quarta-feira, embora já tivessem acontecido outras apresentações desde as 12h30min. O público compareceu em peso, provando que, graças aos esforços dos muitos bonequeiros do estado, há lugar sim para a milenar arte dos títeres.

O espetáculo escolhido para realizar esta abertura foi O Avarento (El Avaro), trazida à cena pela Cia. Tábola Rassa da Espanha, que deu ao texto original de Molière uma versão pra lá de contemporânea. Ao invés da falta de dinheiro, temos a falta água, um tema bastante atual, diga-se de passagem. Ao invés de atores ou bonecos antropomorfos temos torneiras, canos e objetos - recipientes de todas as formas. Mas, as sensações, os sentimentos, os questionamentos presentes no original estão fortes e presentes, graças à qualidade dos atores/animadores Olivier Benoit e Miquel Gallardo.


Arpagão, o avarento do título, encarnado numa torneira enferrujada, consegue nos transmitir todo o seu mau-humor, trazendo uma carga de "anima" que o transforma numa daquelas figuras que nos lembraremos durante anos. A cena de amor, sintetizada num balé entre as vestes dos enamorados, com direito a um ventilador para criar um clima ainda mais sensual, diverte e encanta. O timing preciso, a utilização dos acontecimentos no ambiente do teatro (sempre tem alguém que "esquece" de desligar o celular) e o senso de humor bastante cáustico auxiliam ainda mais para manter a atenção dos espectadores.

A cena final, com Arpagão desistindo do casamento em troca de seus preciosos bens e, literalmente, jorrando água para todos os lados, transforman o palco numa festa molhada, sintetizando a felicidade que, creio eu, estão sentindo os bonequeiros de Florianópolis com a realização do festival.

Vida longa ao Fita! Que Florianópolis ganhe cada vez mais espaços de exibições e espetáculos durante o ano todo. O público e os artistas, com certeza, agradecem.

terça-feira, junho 19, 2007

Lá. Onde?


" Passaram-se mais de 30 anos desde que Sérgio Jockymann escreveu o texto da comédia Lá, um sucesso de público na montagem interpretada por Paulo Goulart nos anos de 1970."

Assim começa a divulgação do espetáculo publicada no Diário Catarinense sobre o espetáculo em cartaz na Casa do Teatro do Grupo Armação até o final de junho. , monólogo de Gerson Prax, dirigido por Wlady Soares, com texto de Sérgio Jockymann. Nele, encontramos o Dr. Raul, preso em uma situação embaraçosa: trancado num banheiro, com o trinco na mão e sem ninguém para ajudá-lo a sair dali. Esta situação, claro, é um pretexto para que possamos ir conhecendo um pouco mais da personalidade e dos conflitos da vida desta personagem.

O ator e o dramaturgo, embora morem em Florianópolis, ainda não são muito conhecidos por aqui, talvez por serem esta suas primeiras encenações na cidade. O mesmo não se pode dizer de Wlady Soares, que nos últimos tempos também realizou Feitiço Andaluz, com atuação de Margarida Baird e Foi Bom Pra Você?, com textos de Luiz Fernando Verissimo.

30 anos passaram-se desde a escrita do texto. 30 longos anos. Naquele tempo ainda não havia celulares, laptops, wireless. Naquele tempo ainda se morria de medo de ser "trancado" em algum lugar por "alguém" que não se podia nomear. Vários textos daquele período constrõem situações semelhantes à este espetáculo. Naquele tempo.

A sensação que tive do espetáculo é que estava assistindo à um trabalho que havia parado no tempo. Teatrão!!! Como se costuma falar pejorativamente. Eu, honestamente, não vejo problema nenhum em se fazer um teatro à moda antiga, de maneira eficaz. Mas, neste trabalho, o que não parece fazer sentido é o conjunto colocado em cena. O figurino é correto, mas pobre de significado. Naturalista, quando o cenário segue por outro caminho. A iluminação não contribui para criar nenhuma linguagem: afinal de contas, qual o tamanho desta "privada"? Ou isso não importa? Qual o tamanho da prisão imposta àquela pessoa que vemos em cena? Porque, em alguns momentos a luz é tão branca que chega a ofuscar os olhos e em outros ganha tons de vermelhos? Isso deveria significar algo?

O trabalho de Gerson Prax é dedicado. Em sua terceira apresentação. Acredito que ainda irá ganhar muito em timing e aprofundar algumas relações com o público que já se insinuam , mas não terminam de serem realizadas. O texto, mesmo que não se proponha a um tour-de-force, tem momentos engraçados e que surpreendem a platéia. Um bom divertimento. A direção é que, no todo, carece de maior trabalho para fazer com que o espetáculo não fique lá, no século passado!