segunda-feira, setembro 10, 2007

Rio X São Paulo



Há muito existe um mercado teatral apoiado no pólo Rio X SP. Se, por um lado, este pólo parece, pelo menos olhando daqui de Santa Catarina, um bloco uniforme onde a produção teatral ganha cara e força de mercado cultural, basta colocá-los lado a lado em um festival que as diferenças gritantes começam a evidenciar-se e chamam a atenção até dos mais desavisados.

Não se trata de reafirmar a defasada idéia de que São Paulo é o berço do teatro dito de pesquisa e que o Rio de Janeiro é a casa das produções comerciais e superficiais. Tais afirmativas jogadas ao acaso são sempre limitadoras e preconceituosas em relação ao trabalho desenvolvido nestes grandes centros. Há muito podemos observar produções realizadas nestas cidades que contradizem essas afirmações. Agora, o que parece ser uma herança vinda destas tradições teatrais é uma certa diferença nos tratamentos visuais dados aos espetáculos. Um bom exemplo disto são os dos últimos espetáculos que assisti no Festival Palco Giratório nesta semana que passou.

De São Paulo veio Gota D'Água - Breviário com a Cia. Breviário, dirigidos por Heron Coelho e Georgette Fadel. O espetáculo, uma adaptação da Gota D'Água de Chico Buarque e Paulo Pontes ( que por sua vez é uma adaptação do mito grego Medéia para a realidade carioca) conta a história de Joana, mulher abandona pelo marido Jasão, sambista que acaba de gravar seu grande sucesso e que a abandona para casar com a filha de um empresário. Assim como no mito grego, o amor desmedido de Joana se converte em um ódio enlouquecido que acaba na morte dos filhos do casal pela mãe, seguida de suicídio (na versão brasileira).

Construído dentro de uma perspectiva épica, em palco arena, a direção praticamente abre mão de qualquer artifício imagético para se fixar na força das palavras e ações contidas no texto e nas músicas contidas no espetáculo, criando uma cena crua e dura de suportar nas 2 horas e meia de espetáculo. O texto, que se mantém brilhante, apesar de um pouco datado, e a interpretação de Georgette Fadel fazem valer a ida ao teatro. Fadel oferece uma variada gama de nuances à sua Joana e canta com propriedade. O restante do elenco (Cristiano Tomiossi, Alexandre Krug, Luis Mármora, Daniela Duarte, Flávia Melman, Luciana Paes de Barros, Alessandro Penezzi e Miró Parma) esforça-se para manter a cena viva, nem sempre atingindo este objetivo.




Do Rio de Janeiro vem Viagem ao Centro da Terra, com a Cia. de Teatro Artesanal, em um espetáculo voltado ao público infanto-juvenil, com direção artística de Gustavo Bicalho e Henrique Gonçalves. O espetáculo, adaptado do clássico romance de Júlio Verne, é de uma incrível concepção imagética, rico em detalhes e com uma grande variedade de técnicas narrativas, partindo da atuação e passando pela narração, cinema e teatro de bonecos.

O elenco (Cid Borges, Edeilton Medeiros, Kátia Kamello e Nilton Marques) tem plena noção do jogo em que se envolve, realizando transições de tempo e espaço para contar a história que parece impossível de ser realizada no teatro. Merece menção também os belíssimos figurinos e adereços assinados por Fernanda Sabino e Henrique Gonçalves e a iluminação de Alexandre Nazareth.

A maior dificuldade do grupo parece ser realmente dar conta de um pesado volume de texto, necessitando de inventar jogos e ações que não se relacionam diretamente com o que está sendo contado. Parece oferecer aos espectadores "pequenos alívios cômicos" para a história maçante, o que não é de todo verdade. O clima de aventura extraordinária parece ser a grande chave do espetáculo - caberia apostar mais nesse sentido.

De toda essa relação entre Rio e São Paulo, uma coisa é certa: Por mais que se tenha uma cena crua (como em Gota d'Água) ou exuberante (como em Viagem ao Centro da Terra) é indispensável a presença de atores com preparação e competência para mantê-las. Georgette Fadel e o elenco da Cia. de Teatro Artesanal nos mostram essa verdade.

Um comentário:

Anônimo disse...

voc~e fala com muita propriedade. a sua fala é um tiro certo.

adorei esse blog.

abraço