sexta-feira, junho 22, 2007

Da Técnica Apurada ao Salto Poético!!!!


Segue a programação do Fita - Festival Internacional de Teatro de Animação e dentro dela pude acompanhar mais dois espetáculos. Uma das características mais marcantes que venho percebendo no trabalho dos bonequeiros que vieram à Florianópolis é a qualidade técnica na criação dos espetáculos. Falando dessa maneira, deveria ser algo óbvio. Para a criação de um espetáculo é necessário conhecer a técnica do trabalho que se está disposto à fazer... mas nem sempre é assim. Comparando com os espetáculos do Isnard Azevedo, por exemplo, o nível dos trabalhos apresentados no Fita parece superar facilmente as expectativas.

Seria essa diferença apenas um reflexo de uma curadoria mais acertada na escolha dos espetáculos? Ou, seria um reflexo da própria linguagem do teatro de bonecos? Explico: Assim como o músico toca um instrumento para expressar sua arte, também o bonequeiro necessita aprender a usar seu instrumento (boneco, máscara, forma, títere, sombra, etc) para estabelecer uma comunicação eficaz através dele. Cria-se, apartir disso, uma consciência da necessidade de aprender uma técnica, renová-la, pesquisá-la para expressar-se através dela. No caso do teatro feito por atores, é mais comum essa falta de consciência. É mais comum encontrar a crença de que basta ser "carismático" ou "um lindo modelo" para poder atuar. Generalizações à parte, existem milhares de exemplos que confirmam esta regra, em ambas as técnicas. Vai daí que é muito comum encontrarmos bonecos que não atuam, somente "chacoalham" em cena, assim como encontrar grupos de teatro que realmente desenvolvem pesquisas centradas na força da atuação dos seus integrantes.

De qualquer forma, o grande desafio parece poder reunir técnica e construção de poética durante uma mesma realização. No caso dos espetáculos de Teatro de Animação é bastante comum termos muita técnica à serviço de pouca expressão. Não chega a ser o caso do espetáculo O Senhor dos Sonhos da Cia. Truks, de São Paulo, SP. O espetáculo, dirigido por Henrique Sitchin, conta a história de Lucas, um menino que tem dificuldades em situar-se entre o sonho e a realidade. É uma bela realização que diverte e encanta, principalmente as crianças. Ao mesmo tempo, não propõe nenhuma mudança significativa ao panorama das realizações de espetáculos para crianças ou mesmo de animação. O elenco conta com uma técnica afiada de manipulação que se utiliza de variadas técnicas para contar uma história.


Por outro lado, podemos apreciar também à O Princípio do Espanto, espetáculo do grupo Morpheus Teatro, também de São Paulo. Espetáculo solo de João Araújo com direção de Luiz Andrade, não se utiliza das palavras para contar sua história, com excessão de um poema de Rilke, utilização em off no início e no fim do espetáculo. Utilizando precisamente da técnica de manipulação-direta, o espetáculo ousa ao explorar um ritmo muito particular e um certo estranhamento presente em toda a duração da obra. Suas pausas, suas pequenas ações e pequenos truques (como a saída da vassoura da caixa, por exemplo) vão guiando os espectadores por um caminho desconhecido e intrigante. O espetáculo não oferece respostas fáceis, deixando um espaço bastante grande para ser completado pelo espectador.

Dessa maneira, chegamos a um salto poético, fartamente perseguido, mas raramente logrado no teatro contemporâneo. Não é puramente elocubração intelectual e conceitual, pois o espetáculo toca o público e emociona. Mas também não é teatro que se rende facilmente à agradar seu público para que ele saia feliz e saltitante do teatro. Uma obra de arte, como todo espetáculo deveria ser!

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